quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Uniformes Uniformizados do Colégio Pedro II: Questões Polêmicas Sobre as Mudanças

Caros colegas profissionais do Direito, venho inaugurar meu mais novo blog com um dos temas mais comentados aqui no Rio de Janeiro pela imprensa.

Nesta semana o Reitor do Colégio Pedro II (instituição de ensino muito tradicional do Rio de Janeiro, fundada em 02/12/1837 e sob a tutela da Administração Pública Federal, conforme dispõe o art. 242, § 2°, da Carta Magna) decidiu colocar um ponto final com a obrigatoriedade de utilização do uniforme escolar por gênero. Na decisão, as meninas e os meninos poderão optar por qual uniforme utilizar, dando a estes a liberdade de optar, sem discriminação, pelo uso de calças ou saias, independentemente do gênero.

Tal decisão se deu por meio da Portaria n° 2.449/2016 e, segundo informações de um canal de rádio popular da região, causou controvérsias entre alguns alunos, ainda que oficialmente não tenha havido qualquer tipo de reclamações pelos pais ou representantes legais. No entanto, alguns destes foram entrevistados por jornais e reprovaram a decisão do diretor da instituição de ensino.

Objetiva o gestor da instituição com tal abolição a manutenção da identidade e a igualdade entre os alunos. Visualizando o ato, a decisão, em primeiro plano, tem por escopo coibir o preconceito por gênero, ou seja, pela opção sexual.

Ainda que seja uma decisão arrojada e que visa a proteção à igualdade, à liberdade e a estreitar as relações cotidianas entre os alunos de sua rede, profissionais se mostraram preocupados com tal atitude. Hoje pela manhã, ao me arrumar para mais um dia de trabalho, ouvia uma rádio local, onde este era o tema central da entrevista, e uma psicóloga mencionou que tal atitude seria irrelevante para o dia a dia da instituição e que o diretor deveria se preocupar com outras situações administrativas e educacionais visando melhorias na qualidade de ensino, tendo em vista que tal mudança decorre de uma recomendação do Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Travestis e Transexuais.

Certamente, representantes da bancada moralista dos Poderes repudiarão tal ato. No entanto, trata-se, ao meu ver, de um tema delicado e de opiniões divididas, onde uma série de fatores são contados, como os costumes, a moral, a religião e o comportamento social (este último acompanhando os avanços sociais propriamente ditos, onde a inclusão é um tema amplamente discutido), o que torna inevitável, ainda que nos dias atuais. Por outro lado, deve-se ter em foco, dentro desta questão, a dignidade da pessoa humana, princípio basilar consagrado pelo art. 1°, III, da Constituição Federal (um dos fundamentos constitucionais), delegando a cada aluno sua capacidade de decidir por optar, ou não, por um uniforme diverso dos costumes que perduraram por mais de cem anos (liberando aos meninos o uso dos trajes femininos e às meninas o uso dos trajes masculinos).

Em contrapartida, poderá pesar numa decisão deste porte uma eventual posição do Ministério da Educação. Neste aspecto, realizei pesquisas acerca da utilização dos uniformes escolares na Rede Pública Federal de Ensino e não localizei qualquer disposição legal que vedasse ou limitasse tal decisão administrativa. 

Ressalta-se que na Escócia, por exemplo, o Kilt, o que chamamos de saia escocesa, é uma vestimenta popular e tradicional deste Estado. Os romanos usavam saias como vestes oficiais, tanto pelo Exército quanto pela nobreza. Até mesmo os Hebreus (seguidores de Deus e grandes colaboradores de textos bíblicos) também faziam uso de tais vestimentas, ainda que mais longas, o que, para alguns historiadores, pareciam vestidos.

Desta feita, cumpre-me limitar a se posicionar no sentido de que não pode o ordenamento jurídico interferir nos direitos fundamentais conferidos constitucionalmente ao cidadão, como é sabido e cediço, visando a valorização da dignidade da pessoa humana, por se tratar de decisão que, friamente analisando, visa a promover  a inclusão social dos alunos independentemente de seu gênero sexual. Por outro lado, o receio deve se dar quando observado o impacto acerca da iniciativa, de modo que a concluir, do ponto de vista objetivo e técnico, se tal mudança poderia acarretar em eventuais ofensas ou injúrias não somente por um pequeno grupo de alunos da própria instituição, como também acerca do comportamento de alguns populares ao lidar com tal situação nas ruas, evitando traumas psicológicos a estes alunos e alunas que representam nosso futuro perante a sociedade em geral, fator este preocupante, se considerarmos o aumento das agressões movidas pelo preconceito de gênero, o que infelizmente vem ocorrendo, principalmente nas grandes cidades.